Final do combate entre Ali e Foreman, com este último nocauteado |
Em
1974 ocorreu uma das mais espetaculares lutas de boxe da História. Os maiores
pugilistas peso-pesados da época, Mohamed Ali e George Foreman se confrontaram
em Kinshasa no então Zaire sob os olhos de milhões de telespectadores. O Zaire,
hoje conhecido como República Democrática do Congo era governado de forma
ditatorial por Mobutu, que não foi ao evento ocorrido em um estádio local com
medo de ser morto.
Congo
foi o nome que os colonizadores belgas deram para a região. Em 1886, após a Conferência
de Berlim, que dividiu o continente africano entre as nações europeias (sim, a
África foi dividida arbitrariamente entre os europeus), o Congo se tornou
propriedade privada do rei da Bélgica, Leopoldo II. Os belgas investiram um
alto capital, explorando minérios e grandes plantações para fabricação de
borracha através de monopólios da metrópole geralmente assumidos por
indústrias.
Trabalhadores africanos - vindos de Ruanda - numa mina no Congo nos anos 20 |
A colonização do Congo pela Bélgica deve ser
inserida no contexto do “imperialismo”, ou seja, a expansão europeia em direção
à África e Ásia, retomando as piores características da colonização da América.
Assim como no resto do continente, o domínio dos belgas sobre o Congo também
foi marcado por atrocidades e pela violência perante as populações nativas.
Estas
eram submetidas a um “paternalismo excludente” que as mantinham inferiorizadas
perante os europeus. Por exemplo: aos africanos não era permitido que
estudassem além do nível primário, que corresponderia ao nosso Ensino
Fundamental. Também lhes era proibido frequentar os mesmo círculos sociais que
os belgas.
A
situação do Congo só foi mudar nos anos 50 do século XX. Ao mesmo tempo em que
a Bélgica começava a pensar na possibilidade de independência, os congoleses
começam com seus movimentos nacionalistas. Havia dois principais: o ABAKO,
liderado por Joseph Kasavube e o Movimento Nacional Congolês (MNC), liderado
por Patrice Lumumba. Este último tinha uma ideia de um país unificado, ao
contrário do ABAKO que previa uma separação entre as etnias locais.
Patrice Lumumba |
Em
1959 os belgas abandonaram o Congo e a sua emancipação foi declarada no ano
seguinte. As eleições no novo país escolhem Kasavubu como presidente e Lumumba
como primeiro-ministro. Mas as diversas etnias aliadas às diferenças de
desenvolvimento de cada região geraram uma violenta guerra civil. Surgem
movimentos separatistas como o de Moises Tschombé, aliado de transnacionais
europeias, que proclama a independência da província de Katanga.
O
conflito teve repercussão no poder do país. Lumumba foi derrubado em setembro
de 1960, sendo assassinado no ano seguinte. O caos se instala. No ano seguinte,
a ONU reintegra Katanga e Tschombé foge. Mas quando as forças de paz deixam o
Congo ele volta e assume e como primeiro-ministro.
Em
1965, Mobutu, que havia sido o responsável pela prisão e morte de Lumumba, dá
um golpe de estado, assume a presidência e centraliza o poder. O nome do país é
mudado de Congo para Zaire, uma denominação anterior ao domínio belga. No
entanto, a nova nação continuava dependendo do capital internacional ligado aos
interesses econômicos ocidentais, tal qual na época colonial.
Claro
que a luta entre Ali e Foreman foi em parte patrocinada por Mobutu na
expectativa de aumentar sua popularidade. Soma-se a isso a defesa dos direitos
dos afrodescendentes nos EUA
contra o segregacionismo racial, a qual Ali apoiava. Não esquecer que o
cinturão de campeão dos pesos-pesados lhe foi retirado por ter se recusado a ir ao
Vietnã, “lutar contra os vietcongues”. Conforme Ali: "Nenhum vietcongue me chamou de crioulo, porque eu lutaria contra
ele?". Ele foi o desafiante de Foreman e o luta ser na África também está
ligado ao combate contra o racismo da parte de Mohamed Ali.
Mobutu |
A luta está registrado no documentário “Quando
éramos reis” (no original When we were
kings) do diretor Leon Gast, lançado somente em 1996. Nele pode-se
perceber, além da atmosfera da luta, a situação social de miséria do povo do
Zaire. As cicatrizes do regime imperialista belga pode ser notada também,
quando, por exemplo, George Foreman desembarca do avião com dois pastores alemães,
cães que eram usados pelas forças militares dos colonizadores para oprimir manifestações
da população nativa.
Mobutu exerceu um governo extremamente
personalista, institucionalizando a política nacional em torno de si. De certo
modo ele tirou o país do caos depois da guerra civil dos anos 60, mas com um
regime ditatorial. Em síntese, o governo era monopólio dele. A ditadura de Mobutu
ainda durou longos anos. Ele só foi cair em 1996, quando a Aliança das Forças
Democráticas para a Libertação do Zaire, uma milícia liderada por Laurent
Kabila avançou pelo país até Kinshasa, destituindo Mobutu. O país trocou
novamente de nome para República Democrática do Congo, mas as mudanças foram
pequenas. O controle da mineração, principal fonte de produção nacional, apenas
passou das mãos de empresas europeias para norte-americanas. Apesar do
território congolês ter recursos minerais e naturais em abundância, grande parte
de sua população vive na miséria. Veja o trailler do filme "Quando éramos reis":
Bibliografia:
VISENTINI, Paulo Fagundes. RIBEIRO, Luiz Dario. PEREIRA, Analucia Danilevicz. Breve história da África. Porto Alegre, Leitura XXI, 2007.
Mazrui. Ali A. Mazrui e Wondji. Christophe. História geral da África, VIII: África desde
1935. Brasília, UNESCO, 2010. Disponível para download.
LINHARES, Maria Yeda. A luta contra a metrópole (Ásia e África).
São Paulo, Brasiliense, 1981.
Nenhum comentário:
Postar um comentário