Durante cerca de
duzentos anos, os portugueses invejaram os espanhóis quanto às suas colônias na
América, por uma razão muito simples: os metais preciosos. Na América Espanhola
regiões como os atuais territórios do México e do Peru eram ricas em ouro e
prata. Mas no Brasil a realidade era diferente. A economia se limitava a
agricultura, principalmente a cana-de-açúcar no nordeste.
Essa situação durou até
a virada do século XVII para o XVIII, quando em viagens explorando o sertão
adentro, bandeirantes descobriram ouro no rio das Velhas, em Minas Gerais. Esse
fato gerou uma verdadeira “corrida do ouro” em direção àquela região. Indivíduos
de diversos lugares do reino português foram para lá em busca de riqueza. Neste
primeiro momento havia muitas dificuldades pela escassez de alimentos.
Foi nesse contexto que
ocorreu a Guerra dos Emboabas, que opôs “paulistas” e “baianos”. As
aspas se justificam, afinal São Paulo e Bahia ainda não eram estados
constituídos da federação. Nem Brasil havia, mas sim a “América Portuguesa”.
Nesse confronto, os paulistas haviam chegado antes à região mineradora e
julgavam que lhes cabia a exploração da região. Entre 1707 e 1708 foram
registrados diversos conflitos entre esses grupos. Os representantes do governo
luso intervieram, apaziguando os ânimos.
Por razões como este conflito, a Coroa portuguesa decidiu
que deveria haver representantes de seu poder no local. Afinal, a região também
deveria estar sob o controle da Colônia, pois tinha o que os portugueses tanto
queriam: o ouro. Criaram-se então, núcleos urbanos, como Vila Rica (atual Ouro
Preto), Vila do Ribeirão de Nossa Senhora do Carmo (atual Mariana) São João del
Rey e São José del Rey (atual Tiradentes), que foram fundados entre 1709 e 1718.
Praça Tiradentes na atual cidade de Ouro Preto, antiga Vila Rica: parte do antigo casario colonial do século XVIII ainda hoje é preservado |
Junto disso, montou-se todo um aparato fiscal. Essa
tributação por muitas vezes se tornou repressiva e excessiva. Havia dois
principais tipos de impostos: o quinto e a capitação. O primeiro destinava 20%
de toda produção local ao rei. Para isso foram criadas as Casas de Fundição nas
quais o ouro recebia o carimbo real e a parte do monarca era arrecadada.
Esse imposto foi uma causa da Revolta de Vila Rica
em 1720. Entre 28 e 29 de junho desse ano, houve um levante de proprietários de
minas em Vila Rica. A este levante se aliaram populares, liderados por Filipe
dos Santos. Estes passaram a assumir o controle da rebelião e se constituir
numa ameaça para a elite local. Mas tropas reais chegaram à cidade em 14 de
julho. Filipe dos Santos foi preso, morto, esquartejado e seu corpo, foi
exposto em público.
O outro imposto era a capitação, que consistia num
tributo sobre cada escravo. A mineração, contudo, passou a decair conforme se
aproximava o século XIX. Mas a faina fiscal não diminuiu. Pelo contrário,
quando a partir de 1763, o quinto não completava a cota mínima de 100 arrobas,
a Coroa portuguesa instituiu a derrama, que obrigava a população local a pagar
o que faltava para completar essa quantia.
Foi a derrama de 1789 uma das principais causas da Inconfidência
Mineira. O movimento começou no final de 1788, buscando proclamar, na
região mineradora, uma República, inspirada, sobretudo na Independência e na
Constituição dos Estados Unidos. Quando a conspiração foi descoberta, os
rebeldes foram presos. A maioria foi expulsa do Brasil e um foi condenado à
morte: José Joaquim da Silva Xavier, o Tiradentes. Muitos tinham contatos com
autoridades coloniais. Mas Tiradentes era apenas um comerciante fracassado e
alferes do Exército.
Nota-se que tanto a Guerra dos Emboabas como a Revolta de
Vila Rica não falavam em Emancipação de Portugal. Tal ideia seria nesse momento
histórico. Estas são conhecidas como Revoltas Coloniais ou Nativistas, contra
uma determinação ou contra as autoridades locais, mas nunca contra o monarca,
ou a favor de uma separação de Portugal.
Liberdade, ainda que tardia: mesmo que a Incofidência Mineira não tivesse como objetivo a separação do Brasil de Portugal, a República brasileira acabou adotando Tiradentes como um de seus heróis; |
Já a Inconfidência Mineira, pode ser considerada uma
Revolta Emancipatória, que despertou certa “consciência nacional”, mesmo que
esta tenha sido direcionada apenas para a região da mineração. Claro que esta
contou com influências do pensamento iluminista europeu e da Revolução
Americana. Ainda assim, deve-se ressaltar que não era a pretensão dos
conspiradores a Independência do Brasil, mas das Minas Gerais. Ocorre que a
República acabou transformando Tiradentes em herói nacional.
A mineração acabou criando os primeiros grandes meios
urbanos no território brasileiro. Ouro Preto, por exemplo, chegou a 20 mil habitantes em 1740. Trouxe, junto consigo, além de mineradores,
comerciantes, que formariam uma espécie de pequena burguesia local. Contudo, só
prosperaram mesmo aqueles homens proprietários de grandes minas, que tinham
muitos escravos. Outra camada privilegiada da sociedade foi a de alguns
tropeiros. Estes faziam o contato entre a região mineradora e o resto da
Colônia. Os funcionários reais também era privilegiados economicamente.
Na verdade, a grande maioria da população era pobre ou
miserável. Os pequenos comerciantes passavam muitas dificuldades, os
faiscadores, pequenos mineradores com autonomia também e havia muitos escravos.
Se o número de escravos era muito grande, o de alforrias também, pois muitos
senhores, durante o declínio da produção aurífera não conseguiram manter seus
escravos devido ao tributo da capitação.
Atual cidade de Tiradentes, antiga São João del Rey: apesar do ouro e das prováveis possibilidades de ascensão social, poucos pertenciam a alta camada da sociedade mineira. |
Apesar de despontar como o primeiro centro urbano do
país, de propiciar grandes riquezas pessoais e propiciar a formação de uma
intelectualidade local, a região das minas foi um reflexo do resto da Colônia:
desigual, dependente e submissa à metrópole portuguesa. Com o tempo e com a escassez do ouro, esta sociedade entrou em rápido declínio. No início do século XIX, a produção aurífera já era bem menor e a população destas cidades também diminuiu. Mesmo assim, a sociedade que surgiu nas minas foi de extrema importância para a interiorização da colonização do Brasil, afinal até aquele momento, a população se restringia à região do litoral.
Bibliografia:
VERGUEIRO, Laura. Opulência e miséria das Minas Gerais. São Paulo, editora
brasiliense, 1981.
FAUSTO, Boris. História Concisa do Brasil. São Paulo,
Edusp, 2006